Produtos derivados de substâncias naturais possuem a capacidade de promover o crescimento e desenvolvimento de plantas de uma forma mais sustentável, além de protegê-las contra pragas e doenças
A humanidade evoluiu, a agricultura também. E observar essa evolução abre as portas para o futuro. Durante milênios, o ser humano observa a natureza para aprender com ela. Hoje, suas lições oferecem caminhos para fazer da agricultura uma atividade ainda mais segura, produtiva e, sobretudo, sustentável.
E é nos ciclos, às vezes invisíveis, da vida nas lavouras que, nas últimas décadas, a ciência tem se debruçado para desenvolver o conhecimento que está redefinindo a produção agrícola. E nesse cenário de transformação, os bioinsumos ou insumos biológios surgem como protagonistas. Em termos históricos, pode-se dizer que a indústria desses insumos vive sua infância. Em termos de impacto, trata-se de um jovem vibrante e transformador.
A adoção desses insumos que, diferentemente dos convencionais, utilizam organismos vivos, como bactérias, fungos e outros agentes biológicos para promover o crescimento e a proteção das plantas, cresce de forma acelerada no Brasil. Um estudo realizado pela consultoria Blink Projetos com a CropLife estima que o mercado de produtos biológicos deve triplicar até 2030, atingindo a cifra de R$ 3,7 bilhões.
Para Felipe Biazola De Grande, engenheiro agrônomo e gerente de produtos biológicos da Ballagro, esse crescimento é impulsionado pelo avanço das pesquisas e desenvolvimento de novas soluções biológicas por parte das empresas, e pela maior adoção das tecnologias pelos produtores, convencidos dos benefícios em termos de produtividade, qualidade e ganhos ambientais que advêm do uso de bioinsumos. “Há 20 anos a gente não tinha uma máquina específica para produzir biológicos ou para extrair um esporo, por exemplo, de um fungo, que é a nossa principal linha de trabalho atualmente. Mas isso foi evoluindo, fomos construindo, projetando equipamentos e hoje é mais fácil”, destaca, exemplificando a evolução dos processos e tecnologias. “Antes, desde a parte de entender determinado microrganismo e o que ele podia trazer de potencial, se ele só controlava um tipo de doença ou se ele poderia ser utilizado de uma outra forma, um outro modo de aplicação, se usaria no tratamento das sementes, numa aplicação via pulverizador ou no suco de plantio. Então todas essas tecnologias que foram acontecendo ao longo desses anos possibilitaram o aumento de demanda”, complementa.
No Brasil, o conceito de bioinsumos foi definido oficialmente a partir do lançamento do Programa Nacional de Bioinsumos, pelo Decreto 10.375 de 26/05/2020, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Estes produtos foram conceituados como “qualquer produto, processo ou tecnologia de origem vegetal, animal ou microbiana, destinado ao uso na produção, no armazenamento e no beneficiamento de de produtos agropecuários, nos sistemas de produção aquáticos ou de florestas plantadas, que interfiram positivamente no crescimento, no desenvolvimento e no mecanismo de resposta de animais, de plantas, de microrganismos e de substâncias derivadas e que interajam com os produtos e os processos físico-químicos e biológicos”.
Felipe Biazola De Grande, engenheiro agrônomo e gerente de produtos biológicos da Ballagro
Benefícios à biodiversidade
Os benefícios dos biológicos vão ainda além dos proveitos na agricultura. Os produtores são favorecidos com o equilíbrio crescente na eficiência das culturas, já que, entre outros aspectos, eles favorecem o equilíbrio do solo, promovem o aumento dos teores de matéria orgânica ao longo do tempo e auxiliam na recuperação de áreas ao contribuir com a disponibilidade de macro e micronutrientes essenciais para o crescimento das plantas.
E o meio ambiente também agradece. Num tempo em que se fala muito em produção sustentável, os bionsumos se mostram indispensáveis para a preservação da biodiversidade do solo, reduzindo a contaminação ambiental, fortalecendo a microbiota (comunidade de microrganismos que vive abaixo da superfície do solo terrestre) e combatendo pragas de maneira sustentável. “Um dos principais benefícios está na própria preservação de tecnologias que temos hoje, inclusive se tratando de defensivos químicos, onde os biológicos atuam em conjunto ou alternância, já que contam com diferentes mecanismos de ação e atuação. Temos, então, uma importante ferramenta para trabalhar o manejo de resistência, tanto de inseticidas quanto de fungicidas, além de uma maior preservação do meio ambiente e da microbiota do nosso maior patrimônio, que é o solo, sendo um pilar para o manejo integrado de pragas e doenças”, exemplifica o gerente de produtos biológicos da Ballagro.
Nos insumos biológicos estão as categorias de biofertilizantes, defensivos biológicos e bioestimulantes, que podem ser utilizados tanto para produção vegetal quanto animal. São inúmeras as possibilidades para implementar os bioinsumos na produção. No Brasil, a produção de grãos, especialmente soja e milho, tem utilizado insumos biológicos na forma de biofertilizantes para melhorar a qualidade do solo e aumentar a eficiência no uso de nutrientes. “Um exemplo disso é o fósforo, para o melhor aproveitamento da adubação”, pontua De Grande.
Além disso, contribuem para a mitigação das mudanças climáticas, sequestrando carbono e reduzem a dependência de fertilizantes químicos. Sua abordagem diversificada minimiza riscos de resistência, garantindo práticas agrícolas mais duradouras e equilibradas. “As culturas praticadas hoje pelos produtores, os produtos e os materiais genéticos irão se modificar e passar por evoluções, mas o solo será o legado para as próximas gerações, por isso precisamos ter cada vez mais uma maior eficiência no uso dele”, ressalta.
Os bioinsumos utilizam organismos vivos, como bactérias, fungos e outros agentes biológicos para promover o crescimento e a proteção das plantas
Otimização do uso de produtos químicos
O uso dos biológicos no chamado manejo integrado promove o uso de ferramentas complementares capazes de otimizar as aplicações e desempenho de insumos e aumentar a sustentabilidade dos sistemas agrícolas. Os biológicos não apenas aumentam a eficiência dos agroquímicos como também podem estender sua vida ao reduzir a pressão de seleção de pragas e doenças resistes aos defensivos químicos.
Somado ao grande benefício de contribuir com a eficiência dos produtos para sanidade das lavouras, o manejo integrado permite entender o cultivo e aportar outros elementos como a bioestimulação, aumentado as produtividades das lavouras. “O produto biológico não substitui o químico. Eles entram em equilíbrio. É uma complementação. Ele vem justamente para potencializar e trazer mais eficácia para o manejo, principalmente se tratando de doenças que atingem as culturas de soja, milho e trigo. Por mais que a aplicação seja próxima em alguns períodos, os biológicos atuam em um momento e o químico em outro. É isso que também buscamos com o manejo biológico”, destaca o engenheiro agrônomo.
“O produto biológico não substitui o químico. Eles entram em equilíbrio. É uma complementação”.
Economia no campo
No aspecto econômico, os insumos biológicos também se mostram benéficos. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) indica que o uso desses insumos no controle biológico de pragas e inoculantes pode gerar uma economia de R$ 165 milhões por ano ao setor agrícola, apenas com o setor de produtos biológicos de controle. Esse fato pode ser explicado por 97% dos insumos biológicos comercializados no Brasil serem de fabricação nacional, gerando um gasto menor com transporte se comparado com insumos químicos importados.
Para os agricultores, eles ajudam no planejamento de seus investimentos para a safra, visto que a maioria dos biológicos são nacionais, com cotações mais estáveis. Assim, os produtores sentem-se mais seguros, sem a preocupação de grandes impactos no custo dos insumos com a flutuação do câmbio, por exemplo, que pode derrubar o retorno sobre a produção rapidamente.
Ainda com relação aos aspectos comerciais, o uso de biológicos abre portas para o mercado internacional, já que várias moléculas agroquímicas são proibidas em muitos países, principalmente no mercado europeu. Os bioinsumos, por sua vez, não têm restrição de uso e entram como alternativa eficaz na produção.
Oportunidades e avanços
E há muito ainda a avançar. De Grande cita, por exemplo, o desafio do manejo de problemas fitossanitários de difícil controle, que já têm resistência a produtos químicos. “Esse problema pode ser mitigado pelo uso de produtos biológicos, que possuem múltiplos mecanismos de ação, evitando a seleção de pragas e daninhas resistentes, atuando, assim, para a proteção a longo prazo das plantas”, comenta.
Olhando para o futuro, são várias as oportunidades que surgem. O mercado de insumos biológicos está em expansão e apresenta um enorme potencial de crescimento no Brasil. Dados da CropLife Brasil, por exemplo, projetam um valor de R$ 17 milhões para o mercado global de bioinsumos para 2030, com taxa de crescimento anual de 23%. No Brasil, segundo dados do Mapa, a produção nacional de bioinsumos tem um crescimento anual de 30%, número maior se comparado com o resto do mundo, que apresenta um crescimento de 18%. Dentro das grandes oportunidades ao agro brasileiro, liderar a pesquisa, utilização, produção e exportação de biológicos parece ser uma das mais promissoras.
Nodulação em soja
Coleóptero colonizado pelo produto Biometil
Vaquinha (diabrotica speciosa) colonizada pelo Ballveria